domingo, junho 17, 2012

GAROTA IPHONE



POR LETÍCIA VIDICA


- Olha, eu estou pegando a minha bolsinha e estou indo embora. Cansei de tentar fazer vocês prestarem atenção em mim, tá legal? Fui vencida por esses bichinhos virtuais...
– eu bufava e ameaçava ir embora, puta porque Lili e Betina não paravam de mexer nos celulares na mesa do bar do Pedrão.

- Pode falar, Diana!!! Sem estresse! Eu só estou respondendo um email de um cliente. – dizia Betina não ligando a mínima para a minha reclamação.

- Você não vive dizendo que seu expediente é em horário comercial?! Por que atender cliente às onze horas da noite de uma sexta-feira?! E você, Liliana, que tanto posta nesse facebook? Que tanto fica dando check-in, dizendo onde está, o que está comendo... pra mim, já deu!!

Surtei geral. Confesso que eu já não estava num bom dia, mas há tempos essa dependência das meninas pelo celular andava me irritando. A Betina, de uns tempos para cá, não largava o novo Iphone dela. Arranjava motivo para tudo só para olhar o email do trabalho, atender cliente remotamente, pesquisar processos... tudo bem, se ela não fizesse isso toda vez que estávamos juntas. A Lili, depois que ficou fera nos aplicativos, vivia se exibindo nas redes sociais. Arrumava motivo em qualquer coisa só para acessá-los. Era para dizer onde estava, para localizar algo, para tirar fotinho...

Eu nunca fui fissurada por tecnologia. Só aceitei ter um rádio porque fui forçada pelo meu querido chefe, mas o meu celular ainda era daqueles bem fora de moda sabe?

***
- Rita, acho que chegou alguma encomenda errada para mim. Eu não comprei nenhum celular novo!!! – eu dizia encucada com a caixa de Iphone, que encontrei em cima da minha mesa logo quando cheguei ao trabalho.

- E aí, Diana, o que achou do seu novo acessório de trabalho? Gostou da surpresa? – dizia Fred, meu chefe, todo feliz em me inserir no mundo dos smartphones.

- Isso é para mim? – desdenhei. Era tudo que eu não precisava no momento.

- Como ISSO??!!! Isso é um Iphone. A melhor invenção de todos os séculos. E é inadmissível que publicitários, como nós, continuemos fora disso. A partir de agora, ele será sua nova ferramenta de trabalho.

Fred terminou a frase como um político termina seu último discurso antes das eleições
– convicto de que será o vencedor. E eu fiquei com cara de bunda ao final. Nem aplaudi. Porém, o pessoal da agência pirou no meu novo aparelhinho. Poxa, eu estava tão feliz com o meu tijolinho...

- Fred... acho que não será necessário mais um aparelho. O rádio já me satisfaz.

- Jamais!!! Não aceito devolução e pode ficar tranquila que as contas serão pagas pela agência.

Pelo menos uma vantagem em tudo isso né? Porque as desvantagens de ter um aparelho da empresa iam ser muitas.

***

- Podemos entrar ou ainda está de mal da gente?

Essas eram Lili e Betina que chegavam abraçadas a pizzas e cervejas como um pedido de desculpas.

- Podem entrar. Fiquem à vontade. Estou terminando de enviar um relatório ... – eu disse me agarrando ao meu novo bichinho virtual, quase meia-noite de uma sexta-feira, enviando um projeto.

- Como assim?! Você quase mata a gente e agora está aí de Iphone? Mas a língua é mesmo maldita né? – ironizava Betina.

- Se eu pudesse, eu jogava isso pela janela. Isso aqui é o meu mais novo instrumento de trabalho. O Fred inventou um blábláblá de que publicitários não podem viver sem isso...

- Ele está certíssimo!!! – vibrava a tiete do Steve Jobs, Lili.

- OK se eu tivesse continuado tendo vida depois que esse bichinho entrou na minha vida... agora tudo é motivo para ver email, fazer teleconferência, mandar projeto... eu não vivo mais!!!! Mal consigo dormir!!! O Fred não para de me encher com isso...

Mal terminei de falar no meu querido chefe e ele me chamou no rádio cobrando deadline do projeto. Isso já é demais não é? Além de eu trabalhar de casa, não ganhar um real a mais por isso, ainda sou cobrada para ser mais rápida no envio?

- Acho que nem se um detetive estivesse me seguindo, eu me sentiria tão perseguida. – eu bufava e me rendia a um pedaço de pizza de mussarela.

- Calma, Diana. Tempos modernos. Isso é apenas mais um ônus do seu bônus. Crescer profissionalmente tem dessas coisas viu? – dizia Betina parecendo minha mãe quando me recrimina por ter crescido.

- Mas tudo tem seu lado positivo, aposto que você vai se amarrar nos aplicativos.

]Para me alegrar e me viciar, Lili passou a madrugada toda me ensinando tudo sobre os aplicativos, programas e todas as funções do celular. Mais uma vez, paguei minha língua. Fiquei fascinada e viciada naquilo.

***

- O que acha desse produto, Diana? – perguntava Fred em meio a uma reunião.

- O quê? – respondia dispersa. Eu não estava atenta a reunião porque não conseguia parar de jogar em um aplicativo novo do Iphone – algo como imagem e ação.

- O projeto que eu te enviei? – questionava ele.

- Você não me mandou nada, Fred. Não tinha email na minha caixa postal.

- Te mandei um link pelo celular ontem. – respondia ele rispidamente.

- Ontem?! Domingo?!

Fred me fuzilou como seu eu tivesse cometido o maior pecado do mundo porque não abri o bendito link em pleno domingo. Alguém pode lembra-lo de que domingo é dia santo? É o dia em que até Deus descansou?

Ao final da reunião, preparei os meus ouvidos para a bronca.

- Diana, nunca mais faça isso!

- O que eu fiz, Fred?

- Eu te mando um projeto importantíssimo, você não vê e me deixa com cara de pateta na frente dos nossos clientes? – bufava ele.

- Desculpe, Fred. Ontem, eu tive um compromisso pessoal, aliás, só para lembrar eu tenho vida pessoal. Achei que não teria problema se você me enviasse isso na segunda, ou melhor, hoje durante o meu horário de trabalho.

- Foi justamente por isso que te demos o Iphone. Para que possamos localizá-la e resolver as pendências fora daqui.

- Tudo bem. Só faltou você dizer que também vai pagar esse adicional a mais né? Por que se for para fazer de graça, eu devolvo agora mesmo o aparelho e com muito prazer.

- Também não é assim. – recuava ele.

- É assim sim!!! Desde que você inventou essa história de Iphone comercial, eu não tenho mais vida, Fred. Não tem mais dia e hora. Você não quer que eu descanse um minuto sequer? Calma! Quando esse troço não existia eu trabalhava tão bem quanto agora não é mesmo?

Joguei as cartas na mesa, inclusive correndo o risco de terminar a noite no departamento pessoal. Porém, o Fred foi sensato e percebeu que estava pegando pesado, mas não quis fazer o favor de levar o Iphone. Tive que aprender a conviver com ele assim mesmo.

***

- Você não falou que ia devolver o aparelho?

- Eu adoraria, Betina, mas você acha que meu chefe deixou? Falando nele ... tava demorando para ele me chamar...

- Nananinanão. – brecava Lili – A gente não prometeu que não íamos mais tocar nos celulares quando estivéssemos juntas?

- Mas, Lili, pode ser importante... – eu respondia tentando tirar o Iphone da mão dela.

- A Lili tá certa. A gente cumpriu nossa promessa, agora é a sua vez.

Não teve jeito. Tive que me render a elas. Afinal de contas, eu tinha sido a primeira a levantar a bandeira de que a vida é melhor sem esse aparelhinho. O problema é que, quando fiz isso, eu ainda não tinha me tornado uma garota Iphone – totalmente dependente desse brinquedinho... espero que a associação de dependentes de celulares anônimos ainda tenha alguma vaga em aberto. Acho que vou precisar deles!

PAPO DE CALCINHA: VOCÊ É UMA VICIADA EM CELUARES? CONHECE ALGUÉM ASSIM? ACHA POSSÍVEL VIVER SEM ELE POR ALGUNS 'MINUTINHOS'?

2 comentários:

paulinhakemi disse...

O celular faz a gente se sentir conectada com o mundo pelas redes sociais, FATO!

Ruim é perceber que está conectada ao mundo distante, mas desconectada de quem está bem ali ao seu lado.

A história é mto divertida e ainda faz pensar... QUEM NUNCA? rsss.

Mirella Gurgel disse...

Ai Leticia fiquei muito feliz com os post novos no mesmo mês! Em relação a celular sou bem tranquila, só uso mesmo pra ouvir música, e só aderi ao nextel para poder falar com meu namorado, com o rádio ele não me escapa.. rsrs, mas tbm ñ tenho muitas responsabilidades no trabalho, e no domingo passo longe de celular ou rádio, a não ser que esteja mofando sozinha em casa.